Existem cidades marcantes. Umas mais do que outras, é certo. Sevilha é uma delas. O que é que se pode dizer de uma cidade onde permaneci pouco mais de 15 horas? Como é que uma urbe se agarra assim, epidermicamente, quando o tempo de permanência é tão curto?
Boas perguntas. Pode ser que o texto que se segue consiga responder a ambas. Primeiro ponto, e aquele que ainda hoje me assalta a memória, mal se pronuncia o nome da cidade espanhola. Calor. É o que mais me recordo de Sevilha. Um calor brutal. Diabólico. Como se saido das profundezas do inferno. Parece melodramático, eu sei, mas não tem ponta de exagero. Imagine-se, caro leitor, numa cidade, às 9.30 da manhã, com uma temperatura a rondar, já a essa hora matinal, os 33º graus. Convêm aqui elucidar o motivo da visita. Não foi turismo, se bem que ele também esteve presente. Foi por motivos "religiosos". A final da Taça UEFA, entre o Porto e o Celtic.
Como dizia, se às 9,30 da manhã, acabadinho de desembarcar do avião proveniente da Invicta, o calor já derretia, daí para a frente, com a marcha inexorável do relógio, a temperatura foi aumentando. Até níveis bem próximos da loucura. Por isso, ataviado de uns calções, munido de uma garrafa de água - que se revelou parca opção - e transpirando em bica, tinha apenas duas opções: ou me refugiava num paraíso qualquer onde o ar condicionado me aliviasse, ou aproveitava o tempo disponível - até às 16 horas - para conhecer um pouco da cidade. Optei pela segunda.
Como rapazinho organizado que me orgulho de ser, tinha já, anteriormente, feito um percurso que me permitisse ver o máximo da cidade, no menor tempo possível. De Sevilha conhecia o óbvio. Cidade do flamenco e da tourada, com reputação de boémia pela horda de estudantes que aí habitam, é também uma cidade profundamente religiosa, onde o apego da fé se nota em alguns edifícios e nos seus bairros mais populares. Assim, guardado na mochila que levava a tiracolo, o percurso contemplava a visita à Catedral e Giralda, aos Alcáceres Reais, à Praça de Espanha e ao rio, parte indelével da cidade, o Guadalquivir.
Não é difícil, ao viajarmos pela cidade, testemunhar a antiguidade de Sevilha, patente nos edifícios e monumentos que, nos seus diversos estilos arquitectónicos - gótico, renascentista, clássico e modernista - lhe conferem um carisma, comum apenas às cidades com história.
"Façamos uma obra tão grande que quando a vejam nos tomem por loucos!"
Foi esta a ordem eclesiástica que deu origem à monumental Catedral de Sevilha, erguida no centro histórico, junto à judiaria (Bairro de Santa Cruz). Assombrosa no exterior pelas suas dimensões e profusão de detalhes esculpidos em pedra, esta catedral é a terceira maior do mundo, apenas suplantada pela Basílica de São Pedro, em Roma, e Saint Paul de Londres. Em estilo gótico, foi construída em 1401, sob a direcção do arquitecto Alonso Martínez, onde se encontrava um templo árabe. Neste edifício todas as medidas pecam por excesso. A título de exemplo: as cinco naves interiores são cobertas por setenta abóbadas, a custódia - obra máxima do renascimento espanhol - pesa trezentos quilos e o altar principal exibe mais de mil figuras representativas de diferentes cenas da vida de Cristo. O órgão - impressionante - possui 6700 tubos e pode ser ouvido todos osdomingos na missa das 9 e 30 h. A torre da Catedral, a Giralda, imagem indissociável de Sevilha, era o antigo minarete do templo muçulmano original. No século XVI foi-lhe acrescentado um conjunto de sinos renascentistas, 25 no total, e coroado com uma estátua, o Giraldillo, símbolo do triunfo da fé cristã. Com 93 metros de altura, permite contemplar toda a cidade a quem tenha coragem de subir 35 rampas a pique. Mas vale o esforço, pois da que foi um dia a torre mais alta do mundo, sentimos, por uma vez na vida, Sevilha aos nossos pés. Em seguida não temos como resistir a mais uma visita, desta vez à maravilha arquitectónica vizinha - os Alcáceres Reais. Designam-se no plural, pois abrigam um conjunto de palácios, que vão desde o alcácer original, morada dos reis árabes, às adições efectuadas pelo rei D. Pedro I, no século XIV, e posteriores obras de restauro e ampliações. São resultado do esforço milenar de várias gerações de governantes em reescrever a história da sua cidade. Representam, por isso, na perfeição a arquitectura civil sevilhana: conjugam os elementos decorativos muçulmanos com outros góticos, renascentistas e barrocos, onde os pátios floridos - de origem romana - alegram os interiores e os jardins perfumados no exterior, convidam a passeios e leituras prolongadas.
Depois disto, destilando água por todos os poros, abanei a bandeira branca da rendição. Sevilha é interessante, tem história, monumentos fabulosos, uma arquitectura que merece ser vista mas...o calor venceu! Às 13 da tarde, os termómetros mostravam, implacáveis: 42º graus. "Bolas", pensei, "vamos para o paraíso". Este estava ali mesmo à mão e de portas bem franqueadas: um moderno e climatizado shopping. "Ufaaaa", o meu suspiro de alívio deve ter sido ouvido à distância...
ps: Ah, não acrescenta nada à história, mas trouxemos a Taça:)
Informações úteis
Indicativo: 0034 e 95 (para Sevilha).
Moeda: euro.
Horários do comérico: os bancos estão abertos normalmente entre as 9 e as 14h00 aos dias de semana e aos sábados entre as 9 e as 13h00. O comércio pratica outros horários: 9h30-14h00 e 17h00-20h00
Diferença horária: mais uma hora do que em Portugal
Segurança: Não sendo uma cidade particularmente perigosa, não convém deixar valores dentro dos automóveis, frequentemente assaltados. Também é prudente não circular com muitos bens e, durante a noite em locais desertos, é preferível apanhar um táxi. As tarifas são semelhantes às praticadas em Portugal, mas pergunte os preços médios de cada "corrida" antes de entrar. No centro histórico é muito comum que mulheres ciganas se aproximem com rosmaninho na mão na tentativa de lhe ler a sina a troco de dinheiro. Não aceitam qualquer tipo de gorjeta (regateiam por somas avultadas), pelo que é melhor afastar-se. O truque é nem olhar.
Moradas e telefones úteis: Consulado de Portugal, Av. del Cid, tel. 954231150; Centro de Informação de Sevilha, c/Arjona, 28, tel. 902194897; Posto de Turismo, Paseo de las Delicias, 9, tel. 954501001; Teletáxis, tel. 954622222; Polícia Local, tel. 092; Urgências, tel. 061.
Transportes: No centro deve circular a pé, pois é a melhor forma de apreciar a cidade. Mas, para distâncias mais longas pode apanhar os transportes urbanos. O bilhete individual para uma viagem custa 90 cêntimos, o passe de um dia € 3 euros e o de três dias € 7. As estações principais estão situadas no Prado de San Sebastián e Plaza de Armas. Se preferir um passeio de coche, deve dirigir-se junto à Catedral, Pç. de Espanha, Torre del Oro, Pç. del Triunfo e Pç. Virgen de los Reyes. Uma hora custa cerca de € 30.
Onde e o que comer
A gastronomia sevilhana é tão diversificada quanto saborosa. Dos pratos mais populares constam o gaspacho, o peixe frito, ovos à flamenca, espinafres com grão, escabeche de peixe com azeite, ovas, os presuntos e outros enchidos, cozido andaluz e o rabo de boi estufado. Na doçaria destacam-se as gemas de San Leandro, que podem ser compradas nos conventos da cidade (experimente na Plaza San Ildefonso) e as rabanadas. Os vinhos da zona são o Jerez, manzanilla e montilla.As refeições são tomadas mais tarde que em Portugal, aqui o prazer da mesa é prolongado: tem início com o ritual das tapas às 12h00, ao qual se segue o almoço pelas 14h00 e à noite tudo se repete às 20h00, pelo que os restaurantes estão vazios antes das 22h. Pode ir petiscar tapas em qualquer das esplanadas da Santa Maria la Blanca e da Leviés, no Bairro de Santa Cruz, pelo ambiente. No Las Terezas (Jiménez de Enciso, 1) e Giralda (Mateo Gago), no mesmo bairro, pela tradição. Nos bares de Triana ao longo do rio pelas vistas e qualidade do peixe frito. No Siglo XVIII (Plaza de San Ana, Triana) pelo espírito cigano. Na Flor de Toranzo (Gamazo, 7) para desfrutar do ambiente do Arenal. São apenas sugestões que não invalidam outras experiências por toda a cidade. Para almoçar ou jantar recomendam-se os tradicionais Puerta Grande (Atonia Diaz, Arenal) pela sopa de tomate e rabo de boi, o Modesto (Cano e Coto, 5, Santa Cruz) pelo marisco e a Casa Robles pelos vinhos e tudo o resto (Alvarez Quintero, 58, Centro). No Poncio (Victoria, 8, Triana) a dourada ao sal é sempre fresca e no Patio San Eloy (Castelar 1, Centro) os petiscos tentadores.
Onde ficar
Em Sevilha a oferta é considerável, embora por épocas mais festivas seja preferível marcar o alojamento com bastante antecedência. O Hotel Los Seises (Segovias, 6 Santa Cruz, 954229495), a Casa Imperial (Imperial, 29, Santa Cruz, 954500330) e oAC de Sevilha (Av. Manuel Siurot, 25, 954230505) são os mais trendy; Las Casa de La Juderia (Plaza Santa Maria de La Blanca, 954415150) e o Hotel Doña Maria (Don Remondo, 19, Santa Cruz, 954224990) os mais charmosos. Se procura ambientes de luxo então o Hotel Alfonso XIII (San Fernando, 2, Centro, 95491 7000) é o mais indicado. Na cidade de Carmona, a cerca de 30 km de Sevilha, não pode perder a Casa de Carmona (Plaza de Lasso, 1, tel. 954 144 151; fax: 954 190 189; www.casadecarmona.com), uma casa-palácio convertida em hotel de luxo, com ambiente e decoração muito próximas do típico palacete andaluz, com apenas 33 quartos (todos eles com uma personalidade própria) e magníficos jardins.
Espectáculos de flamenco
As raízes desta música e dança estão perdidas entre a cultura hindu, árabe, judia, grega e castelhana. Mas, sem dúvida, que foram os ciganos que melhor a absorveram e preservaram. Para ver e ouvir na Casa de La Memoria (Ximénez de Enciso, 28), Los Gallos (Plaza de Santa Cruz, 11), Puerta de Tria (Castilla, 137) e Casa Anselma (Pages del Corro, 49).
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